terça-feira, 7 de setembro de 2010

Arte e Humanidade nos tempos de infância


Fotopema Flavio Pettinichi- ano 2009

Arte nos tempos de infância

Éramos Pan, Perséfone, Gaia sem Cronos e outros tantos Deuses olímpicos em nosso Éden feito de lama e trigais, deuses que todo poderiam realizar, desde montar em Pegassus até voar perto do sol feito Ícaro sem medos.
Para nós, um dia eu falarei quem éramos nós, a vida era uma atitude de arte e criação, como é para toda criança acho, mas existia algo mais em nosso reino. Labirintos de flores e mistérios, portais cósmicos nas noites de luas e pirilampos, dragões místicos e distantes geografias desenhadas nas negras nuvens dos dias de tormentas. assim fomos aprendendo a lidar com a magia intrínseca do Homem da qual o mesmo homem deu a chamar de arte ou atitude criadora.
Em dias de chuva fazíamos montanhas de lama, amassando pacientemente a terra ate ela virar o que depois viríamos a conhecer como argila ou cerâmica, para nós isso era vida, uma espécie de sermos deuses que poderiam criar tudo o que quiserem, desde um pequeno cântaro ate a cabeça de um mostro vindo de outra galáxia, que claro, nunca teria menos de 5 olhos.
Criaturas divinas e fantásticas iam surgindo entre uma risada e alguma peça quebrada, carros de três rodas, pássaros de longos bicos e penas gigantescas, e claro, a mulher e o homem, pois deuses sempre queriam ter as suas criaturas próprias para poder governar para os seu anseios.
As minhas criaturas tinham o poder do vôo e a palavra, a do outro teria com certeza o poder da força e os sortilégios e por ai íamos criando um exercito de personagens que um dia guardaríamos no coração, para poder enfrentar a vida e os seus desígnios.
Isso acontecia em nosso território, mas tínhamos outro que era dentro da casa e ai existiam outras portas de percepção espalhadas pelas paredes, eram as telas pintadas pelo meu pai.
Lembro bem de duas, uma bem diferente da outra, meu pai não tinha um estilo de pintar ou desenhar, a sua liberdade espiritual e criadora nunca ia se enclausurar numa forma predeterminada ,para ele pintar era o mesmo que amar, e anos depois eu compreendi isso no amor, o amor não tem uma forma determinada e isso nos torna verdadeiramente humanos.
Uma das telas tinha pintado um cortiço, na realidade era à entrada deste, por onde eu todos os dias me perdia nas suas janelas e portas escondidas nas nuances deixadas pelo pincel.
Era uma entrada de um lugar sombrio, que para mim não era, para mim era descoberta, quem teria morado ai?, quem moraria ainda na memória de alguém?, como era viver num lugar tão amontoado de sombras?, já que a minha moradia era de cores e luz.
Eu sei que passava horas a fitar essa porta que guardava como já falei, tantas outras portas, esperando sempre um dia achar uma delas aberta, quem sabe com alguém que me contasse como era a vida na cidade ou coisa parecida.
A outra tela era um retrato, pintado a nanquim de Albert Sweitzer, um senhor de bigodes que com uma mão no queixo me olhava pensativo me perguntando sempre o mesmo, você sabe quem eu sou?
Eu respondia sempre pra ele,
Eu sei você é o meu pai dentro de muitos, muitos anos, então ele piscava um olho e sorria pra mim.
Eu ria dele, pois meu pai era bem mais belo que ele.
Anos depois vim saber quem era esse velinho, que pintado com mais de um milhão de traços de nanquim, eu passava horas a admirar para um dia eu poder sentir orgulho do meu pai por tão belo presente.
Albert Sweitzer foi a infinita grandeza do homem quando este se entrega para o homem, sem mais razão que a solidariedade e a bondade divina para com os que sofrem.

Flavio Petinichi – 07- 09- 2010.

(Albert Sweitzer – 1875- 1965
Em 1905, iniciou o curso de medicina, e seis anos mais tarde, já formado, casou-se e decidiu partir para Lambaréné, no Gabão, onde uma missão necessitava de médicos. Ao deparar-se com a falta de recursos iniciais, improvisou um consultório num antigo galinheiro e atendeu seus pacientes enfrentando obstáculos como o clima hostil, a falta de higiene, o idioma que não entendia, a carência de remédios e instrumental insuficiente. Tratava de mais de 40 doentes por dia.)
Nobel da Paz em 1952-
Fonte Wilkipedia-

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